quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

QUEM DISSE QUE O DIREITO É DIREITO?


Mauricio Martins Reis, Professor universitário - jornal do comercio, 05/02/2012

O juiz que mandou soltar os responsáveis pela morte de duas pessoas em acidente de trânsito ocorrido no Litoral gaúcho logo após o Réveillon, ao ser entrevistado sobre os fundamentos de sua decisão, assinalou duas considerações dignas de comentário. Que existem decisões no sentido da manutenção da prisão, embora a jurisprudência não siga esse entendimento, e que outro magistrado poderia ter um entendimento diferente acerca do mesmo fato. Ora, prezado leitor, se me permite a metáfora, não estamos confundindo o foro – o lugar onde supostamente se realiza a Justiça – com um restaurante ao estilo buffet, onde cada um se serve do que bem lhe aprouver? Se existem decisões num e noutro sentido sobre o mesmo acontecimento (entenda-se, sobre determinada situação que se repete a todo o momento com semelhantes características, por exemplo, um acidente automobilístico cujo autor não tinha habilitação ou estava bêbado ao volante), a Justiça falha em seu dever mais primário, porque não deixa pegadas de uniformidade a respeito do que é (o) direito.

Como podemos aceitar desrespeito mais flagrante diante da expectativa das pessoas perante o que é a Justiça, se esta pode ser mais de uma coisa ao mesmo tempo, cuja variação depende apenas de quem a formula? Pensamos que dois juízes não podem dissentir sobre o mesmo assunto jurídico, se presentes estão as mesmas circunstâncias (ou semelhantes são os aspectos mais relevantes do evento) em dois processos diferentes para os quais cada qual detém a competência para dizer o direito. A função social do Direito transcende ao caso particular. Se cada um dos dois magistrados sentenciar cada qual ao seu modo, imbuídos do espírito de que correspondente decisão, singularmente considerada, já se justifica pelo poder estatal conferido à sua autoridade, estão errados. O Direito somente se aperfeiçoa por completo se aspirar à uniformidade de suas respostas, ou, ainda, se constantemente justificar eventuais diferenças à luz de argumentos que discriminem tais e quais casos. O maior problema da convicção do entrevistado está não propriamente na decisão por ele prolatada, mas na sua certeza de que, tanto ele como o outro colega de toga, todos estão bem desempenhando o seu papel em um Estado Democrático de Direito. Como se ambos estivessem no refeitório do foro escolhendo entre macarrão e arroz com feijão. E ao perdedor (o cidadão), as batatas!

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